Distopias - parte 1
Caro leitor,
Adoro distopias, visões negativas de um futuro distante ou de uma realidade paralela. Adoro principalmente aquelas que envolvem conspirações ou mundos pós-apocalípticos, e que espelham a luta diária contra o mundo. Adoro as que acabam com um final feliz, mas também adoro as que nos deixam suspensos em "mid-air".
Há muito tempo iniciei a leitura de "1984", obra épica de George Orwell. Não me lembro de a ter terminado. E agora que a fome de leituras é mais incontrolável dado o passo lento do verão, aproveitei para deitar uns olhos à minha biblioteca pessoal - imagine aquela biblioteca privada, dentro de um rico palacete, cujos livros se alcançam com um escada com rodinhas. Pois, imagine essa que sempre é mais interessante do que a minha comum biblioteca. Pois enquanto vislumbrava os títulos dos livros esquecidos naquela parte mais recôndita da minha biblioteca, sem necessitar da escada com rodinhas, deparo-me com "1984". Tomo a resolução de o ler/reler e depois de ver o filme homónimo, a versão mais recente, de Michael Radford com John Hurt, realizada no próprio ano de 1984. Gosto de estabelecer comparações entre a obra literária e o obra cinematográfica que dela se inspirou.
Não é um livro de leitura fácil. É um livro com alusões a repressões, mortes, violência, medo, poder incontestável, mentiras, conspirações, ausência de sentimentos, fome, guerra,... É um livro de escassos diálogos. É um livro político. É um livro sobre uma distopia que, ao contrário das mais recentes adaptações ao cinema de visões distópicas - as trilogias "Os Jogos da Fome" e "Divergente" - não acaba com o triunfo esperado. Li o livro até ao fim e espantei-me com alguns passos da trama- espantei-me mesmo. Não estava a contar com uma ou outra reviravolta. Percebi a mensagem, percebi a posição das personagens que ganham destaque no livro.
O filme de 1984 de Radford é brilhante na construção do ambiente retratado no livro e os atores conseguem brilhar nas suas atuações. No entanto, se não tivesse lido o livro acho que detestaria o filme, acho que o não compreenderia e não o teria visto até ao fim. Recomendo o livro aos corajosos que aguentem referências a ideais políticos e visões negativas do mundo e das relações interpessoais. Recomendo-o aos leitores que busquem na literatura previsões de um futuro que pode ou não - depenendo de nós - ser o nosso.
Li algures que o mérito da ficção científica não é prever o futuro, mas retratar um futuro tão horrível que as pessoas sintam a necessidade de fazer algo para que esse futuro seja apenas ficção. É por isso que "1984" é para muitos o livro mais importante do século.